Global Journal of Human-Social Science, A: Arts and Humanities, Volume 21 Issue 12
Método e Questão Judaica em Hannah Arendt Romildo Gomes Pinheiro Gomes Pinheiro Resumo- O artigo procura identificar o núcleo metodológico das Origens do Totalitarismo nas origens ideológicas da miséria alemã. Demonstra, em seguida, como esta perspectiva é mobilizada no livro 1 das Origens do Totalitarismo, dedicado ao surgimento do anti-semitismo. Palavras chave: arendt, método, anti-semitismo. Abstract- The article seeks to identify the methodological core of the Origins of Totalitarianism in the ideological origins of German misery. It then demonstrates how this perspective is mobilized in book 1 of the Origins of Totalitarianism, dedicated to the rise of modern anti-Semitism. Keywords: arendt, metod, anti-semitism. I. Q uestões de M étodo s Origens do Totalitarismo foi publicado em 1951. Este grande livro na verdade é constituído por três livros, cuja densidade conceitual e histórica pode ser lida independentemente dos demais. Ao mesmo tempo, os três livros são articulados, e a questão que passa então a ser objeto de discussão é como encadeá-los em um todo explicativo. E, enfim, se, do ponto de vista metodológico, há um princípio comum que unifica a perspectiva de Arendt nas OT. Dado os limites do presente texto, em relação à primeira tarefa, explorarei somente o livro 1 sobre o anti-semitismo. Já para a segunda, de que passo a me ocupar agora, tentarei discernir a questão do método que envolve a obra, procurando, em seguida, encontrar no livro 1 sua evidência explicativa. No Prefácio do livro nós encontramos as clássicas perguntas do historiador: “O que se passou? Por que isto se passou? Como isto foi possível?” (ARENDT, 2002a, p. 8). As perguntas do historiador ocorreram quando a Alemanha atinge o “ponto zero” da sua história, isto é, quando um novo ‘regime de historicidade’ passa a estar em “disputa”. Esta noção de “regime de historicidade”, que retomo de François Hartog (Hartog, 2014), recobre aspectos conceituais e históricos na obra de Arendt, e em alguns textos nós encontramos explicados a relevância metodológica desta perspectiva. Arendt envereda pela consideração do primado que o evento histórico tem para a historiografia: a história somente se mostra através dos seus momentos inaugurais, “de aceleração do agora”. O que significa que a “novidade é o reino do historiador, que – ao contrário do cientista natural, que se interessa por factos regular e permanentemente recorrentes – se consagra a factos que ocorrem sempre uma só vez. Esta novidade pode ser distorcida se o historiador, invocando a causalidade, se pretender capaz de explicar os acontecimentos por meio de um encadeamento de causas que os teriam produzidos.” (Arendt, 2001, p. 246) Reconhece, portanto, no evento histórico, uma singularidade que ultrapassa os fatores determinantes que o teriam condicionado, como evoca com recorrência, por exemplo, a disparidade entre a causa e os efeitos desencadeados da Primeira Guerra Mundia l 1 Nós podemos agora tentar interrogar de que modo nomear este interregno situado entre o início do passado e o acontecimento final na obra as OT. Na obra que compõe o sugestivo título a este respeito, Entre o Passado e o Futuro, Arendt nomeia este intervalo . Esta recusa da ideia de causa não significa, todavia, que o acontecimento se encontre disperso na história. Isto é, ao mesmo tempo, Arendt considera que o evento histórico ilumina retrospectivamente o que ocorreu. “É o acontecimento que esclarece o seu próprio passado, e não pode nunca ser deduzido dele” (Idem, p. 246), de modo que o passado só chega plenamente a existência quando o acontecimento se produz. Trata-se de um método ex post fact d e inves t i gaç ã o: de sde qu e o e vento e m q u est ã o é s ufic i en teme nt e impo rt a nte para l an ç a r lu z s obre s eu pr ópri o passa d o, a hi stóri a tor n a- se começo. (Idem, p. 2 4 6 ), d e modo que somente en tão se e stabelece um a hi s tória q u e po de s er narrada porque pos sui u m iní cio e um fi m. Isto é, o pr ó pri o p a ssa do p as s a a t er um c o meço, de t al mo d o q ue um começo do passado que permanec ia a té então escond ido aos olhos do his t oriador fi na lm e n te v eio à luz. En fi m, o aconte c imento s e to r na o fim, telos, d es te começo r ecé m de s cob e rto pelo his to riador. O acontecimento é o fim e o culminar de um processo que ocorreu, “um chegar no tempo”, como diz Arendt. 1 1 Para a 1ª Guerra Mundial como divisor de águas do regime de historicidade contemporâneo, ver H. Arendt, Sobre a Revolução, São Paulo, Cia das Letras, 2011, pp. 35-47. Foi não somente a desintegração dos Impérios Continentais que veio à luz, como o Austro-húngaro e sua Monarquia Dual, mas também as Revoluções Alemãs, Húngara e Insurreição em Viena, derrotadas, e a Revolução Russa, vitoriosa, mas cuja conexão explosiva foi finalmente sucedida pela estabilização da Revolução em um só país, no famoso Outubro Alemão que não veio. A crença dos bolcheviques se defrontava com as fronteiras das trincheiras da própria guerra com a Alemanha, e quando sobreveio o declínio do II Império Alemão, “a social- democracia alemã não se entusiasmara com a ideia de uma revolução”. Cf. Daniel Arãao Reis, A Revolução Russa – 1917-1921, SP, Brasiliense, 1989, pp. 106-107. Ou talvez retificando um pouco este comentário, a ala mais radical e Conselhista fora derrotada pela extrema-direita com o beneplácito da social-democracia. A © 2021 Global Journals Volume XXI Issue XII Version I 1 ( ) Global Journal of Human Social Science - Year 2021 A Author: e-mail: romildogp81@yahoo.com.br
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