Global Journal of Human-Social Science, A: Arts and Humanities, Volume 21 Issue 12
Humanos. Ambos partem da consideração que o desdobramento político da questão judaica deve ser tomado em conta a partir da relação do judeu com o Estado em diferentes formações nacionais. Ao associar o destino do judeu ao destino do Estado-Nação, Arendt e Marx coincidem na problematização da relação do judeu com o Estado-Nação na França e na Alemanha. Isto é, como o Judeu determina o destino do Estado- Nação pelo capital financeiro que “pelo dinheiro determina o destino do Império Autro-Húngaro”. Enfim, a descrição sobre os dilemas sociais da emancipação social dos judeus na Era da Revolução apreenderá no fenômeno da dupla consciência uma cisão csaracterística da sociedade burguesa, como será novamente exposto na discussão sobre o fenômeno da dupla consciência do jude u 9 III. A rendt, M arx e a Q uestão J udaica . Esta ênfase na relação dos judeus com os destinos da Revolução Francesa e do Estado-Nação é já posta de maneira explícita na introdução do livro III. Arendt associa o ódio mobilizado contra o judeu à famosa análise de Alexis de Tocqueville consagrada em O Antigo Regime e a Revolução a explicar as razões pelas quais os nobres foram tão odiados na época da Revolução. A explicação de Tocqueville é que na França o feudalismo continuou sendo uma importante instituição civil mesmo quando deixou de ser uma instituição política. Quanto uma parte das instituições da Idade Média foram destituídas, o ódio aos nobres pôde adquirir uma outra escala quando os privilégios agora estavam desguarnecidos do poder político. (Tocqueville, 1997, p. 76). Para Arendt, mutatis mutandis, o ódio aos judeus nos discursos anti-semitas foi decorrente da condição de privilégio dos Judeus no Estado quando a aristocracia se contrapõe ao Estado. É o nobre odiado que agora passa a odiar quando seus privilégios de casta são ameaçados, espécie de inversão da Reação no interior do discurso da Revolução quando transplantado para a situação alemã. Pensando bem, a discussão sobre as ambiguidades da emancipação do Judeus em relação 9 Marx afirma em A Questão Judaica : “A cisão do homem em público e privado, o deslocamento da religião do Estado para a sociedade burguesa, não constitui um estágio, e sim a realização plena da emancipação política, a qual, portanto, não anula nem busca anular a religiosidade real do homem.” op. cit. pp. Se compreendo bem Arendt, a dupla consciência do judeu recobre esta cisão em contexto de atraso, onde os limites da distinção são esfumados. H. Arendt, op. cit. p. P. Gilroy desenvolve esta análise da dupla consciência no estudo dos negros no período pós-emancipatório da escravidão nos EUA a partir de Du Bois, cujo resumo segue: “Todos sentem alguma vez sua dualidade - um lado americano, um lado negro; duas almas, dois pensamentos, dois esforços inconciliáveis; dois ideais em guerra em um só corpo escuro, cuja forca tenaz é apenas o que a impede de se dilacerar.” Atlântico Negro, Modernidade e dupla consciência , SP, Ed. 34, p. 248. ao Estado retoma a discussão de Marx sobre os limites da emancipação política dos Judeus, e de toda emancipação política em geral, do mesmo modo que os capítulos consagrados a discriminação dos Judeus na sociedade discute os limites de toda emancipação social advinda pelo privilégio. Esta associação entre os dois autores é importante, porque a análise de Arendt sobre “a questão judaica” passa a funcionar como uma “prolongação” da hipótese de Marx da situação do judeu no contexto de “atraso ” 10 Em primeiro lugar, para a questão judaica, a questão comum concerne a crítica da emancipação dos judeus na Alemanha, onde a chave explicativa da questão judaica é a considerada tomando em conta a relação do judeu com o Estado, como já salientado. Na Alemanha o Estado ainda não se emancipou politicamente, é um Estado “atrasado”, carregado pelos vestígios do ancien regime europeu encarnados no I Reich “Alemão”. Trata-se de um Estado que ainda não se emancipou politicamente, incapaz de tratar o judeu como cidadão. (Marx, 2010, p. 35) A análise comparativa de Marx é retomada por Arendt, em um primeiro plano, no entendimento do significado da emancipação política dos Judeus na Revolução Francesa. “Era necessário abolir as restrições aos direitos dos Judeus e a seus privilégios ao mesmo tempo que as outras liberdades e direitos particulares.” (Arendt, 2002c, p. 33) Esta emancipação é acompanhada pelo desenvolvimento de um Estado independente, acima das classes sociais, capaz de assegurar a unidade nacional. Só que para o desenvolvimento do Estado-Nação, o crédito Judeu foi fundamental, praticados já em grande escala pelos Judeus para Nobreza. De modo que o Judeu do Crédito passou a desfrutar de privilégios do Estado em razão da dívida pública adquirida pelo Estado. O que significa que a emancipação política dos Judeus plenamente acordada no século XIX foi ambígua porque, de um lado, ela se inscrevia na estrutura . Naturalmente que identificá-los sob a perspectiva de uma prolongação da análise de Arendt daquela de Marx não significa que estejamos apagando a irredutibilidade de cada ponto de vista histórico acerca da questão judaica na Alemanha, mas somente chamando atenção para aquilo que há de comum entre as duas análises, e como, sob o fundo desta aproximação, os fios histórico-políticos que articulam os demais livros das OT são melhor compreendidos. 10 Sobre o estudo dos judeus em situação de atraso social e político, a referência é Marx em A Questão Judaica , novamente, pela razão evidente que situa o problema da emancipação no contexto pós- revolucionário, tanto quanto Arendt. Nossa autora expõe esta perspectiva de análise dos judeus como grupo social dividido entre os privilégios da corte, os judeus de gueto e o desprezo pelos intelectuais da Bildung alemã claramente nos Ecrits Juifs, op. cit . p. 189, como já assinalado. © 2021 Global Journals Volume XXI Issue XII Version I 5 ( ) Global Journal of Human Social Science - Year 2021 A Método e Questão Judaica em Hannah Arendt
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