Global Journal of Human Social Science, D: History, Archaeology and Anthroplogy, Volume 23 Issue 2

Volume XXIII Issue II Version I 23 ( ) Global Journal of Human Social Science - Year 2023 D © 2023 Global Journals Morals and Violence: Principles for a Historical and Social Cartography of Values § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (Código Penal Brasileiro de 1940). No entanto, observamos que a própria letra da lei reconhece uma defesa da honra, diminuindo a pena consideravelmente. No que diz respeito ao contexto malletense, esses valores poderiam ser reconhecidos até mesmo como justificada, pois a honra e a moral são as bases sociais destes sujeitos em 1959. Essas relações atravessam todos os sujeitos, independentemente de seu sexo ou credo, pois os sujeitos considerados “dignos” seriam aqueles honrados e morais: é o homem trabalhador, provedor da família, praticante dos bons costumes; é a mulher dona de casa, mãe, se solteira é virgem e recatada. Desta forma observamos ali, uma violência tomando caráter valorativo e instrumental mais do que apenas explosões coléricas isoladas. A violência de Hernani, toma um caráter legítimo, uma vez que justificou a defesa de valores sociais profundamente enraizados em seu contexto. Assim, "Nesse quadro, a violência é, ao mesmo tempo, legítima e obrigatória, para escapar da vergonha. (Muchembled, 2012, p. 27).”. Da mesma forma, a defesa apropriou elementos morais que produziriam uma inocência sobre o homicida. Todavia, produz algo maior do que uma verdade sobre uma inocência ou culpa, também produz mecanismos de reconstituição da moral rompida através dos agenciamentos concretos acionados pelo Poder Judiciário. A violência nesse processo n. 08/59, foi além da física. Uma violência que se ressoa também nas leis, nos valores, nos rituais para se produzir a verdade. Uma violência que não está isolada no tempo, nem em classes sociais. É uma violência, como Dadoun nos apontou: À flor da pele e ao fundo da alma - assim é a violência no cotidiano, uma violência que corre e ricocheteia sobre todas as superfícies de nossa existência e que uma palavra, um gesto, uma imagem, um grito, uma sombra que seja, capta, sustenta e relança indefinidamente, e que, no entanto, desta espuma dos dias, abre à alma vertiginosos abismos [...] (Dadoun, 1998, p. 43). Ainda que a sociedade ocidental tenha passado por várias mudanças nos costumes, buscando organizar seus modos de viver, suas condutas e suas manifestações de violência não significa superação. O sociólogo Norbert Elias, quando analisou o controle social e o autocontrole nos expôs algo importante. Em relação à civilização com a formação dos Estados Nação e o fim do Ancien Régime : A civilização não é “razoavél”, nem racional, como também não é “irracional”. É posta em movimento cegamente e mantida em movimento pela dinâmica autônoma de uma rede de relacionamentos, por mudanças específicas na maneira como as pessoas se veem obrigadas a conviver. (Elias, 1993, p. 195). Se essa relação de obrigação do convívio se manifesta constantemente, por si ela tende a produzir rupturas nas quais o Estado não teria como evitar, por exemplo, a violência no cotidiano. Destarte, precisou-se introduzir uma forma de autocontrole que foi, pouco a pouco internalizado pela sociedade com “[...] investidas de sentimento de vergonha, que a regulação de toda vida instintiva e afetiva por um firme autocontrole se torna cada vez mais estável, uniforme e generalizada.” (Elias, 1993, p. 194). Podemos teorizar que parte desses processos definem e adornam a moral na sociedade. Ela não é um produto do estado, nem um produto propriamente dos indivíduos, mas sim, uma mescla de tudo que limita e conduz a vida dos sujeitos em sociedade, seja leis de Estado ou práticas sociais que transitam por gerações. Desta forma, podemos explicar o caráter não determinista da moral, não significa que ela é bom ou mau, nem certo ou errado. Sua manifestação ocorre em diferentes graus, desde o convívio pacifico a rupturas violência do tecido social. Essas rupturas violentas da moral não podem ser contidas pela ação do Estado. São posteriormente punidas por ele, mas, não são antecipadas por ele. Girard falou sobre um caráter visceral da violência: [...]um jogo diabólico que exige a intermediação de heróis míticos, deuses e ancestrais divinizados a quem é atribuída a encarnação imaginária da violência. Mas a violência é de todos e está em todos. Mesmo que o sistema judiciário contemporâneo acabe por racionalizar toda a sede de vingança que escorre pelos poros do sistema social, parece ser impossível não ter que usar da violência quando se quer liquidá-la e é exatamente por isso que ela é interminável (Girard, 1990, p. 11). A partir de Girard, podemos entender que os esforços do Estado, mesmo através do Poder Judiciário, não conseguem conter a violência. Ela se manifesta de forma imprevisível e, mesmo o sujeito mais “moralista e idôneo” de uma sociedade, poderá responder violentamente quando seus valores forem questionados ou “maculados”. Vale ressaltar, que nem toda violência é produto de uma ruptura moral, embora toda ruptura moral apresenta uma forma de violência, não necessariamente física, isto não é determinante. III. A R eafirmação e M anutenção dos V alores A moral é o elemento que está no cerne desta pesquisa e que atravessa nossa cartografia, nossas fontes e nossos sujeitos. Recorremos à Nietzsche, para tentar compreender como a moral permeia a sociedade e como ela também toma um caráter violento sobre a vida dos sujeitos. Assim, poderemos compreender melhor como Hernani se desenvolveu como um sujeito

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