Global Journal of Human Social Science, E: Economics, Volume 23 Issue 2
Nesse intuito, o objetivo desse artigo é analisar as conformações do Estado no âmbito da gestão financeira dos recursos públicos, no contexto de capitalismo sob predominância financeira, apontando sua correlação com os desdobramentos da pobreza no Brasil, contribuindo, assim, para uma construção crítica sobre o tema, tendo em vista que, acreditamos ser este o único caminho para o enfrentamento lúcido. Por este motivo, o presente texto é extremamente pertinente para o momento em que vivemos. Marcado pelo agravamento da pobreza e da fome no mundo muitas análises tendem, a um primeiro momento, justificar sua causa à pandemia do Corona Vírus Disease (COVID-19) e à crise do sistema capitalista que nos assola na atualidade, o que favorece a naturalização da questão e a proposição de enfrentamentos ingênuos que estão longe da verdadeira essência do problema. Para esclarecer, o Brasil retornou ao mapa da fome mundial com o corolário direto das políticas ultraneoliberais em curso no país e adoção de uma política econômica marcada pela austeridade fiscal, que tem seu ponto de referência a Emenda Constitucional (EC) 95 que congelou por 20 anos os gastos na área social. No ano de 2022, conforme o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar da Rede PENSSA N 1 , 33,1 milhões de pessoas passavam fome no Brasil — o que representa 14 milhões habitantes e mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau: leve, moderado ou grav e 2 . O país alcançou nível recorde de pobreza, conforme IBGE 3 (2022), cerca de 62,5 milhões de habitantes no Brasil estavam dentro da linha de pobreza proposta pelo Banco Mundial, o equivalente a 29,4% da população brasileira. Concernente a discussão aqui proposta, problematizamos, na primeira seção, o debate sobre as crises do capital, as conformações do Estado e as políticas sociais no Brasil compreendendo o papel do fundo público no capitalismo atual. A segunda seção apresenta uma reflexão teórica sobre o fundo público demonstrando as bases tributárias que financiam as políticas sociais no Brasil, evidenciado a enorme regressividade da incidência dos tributos sobre a 1 Disponível em https://olheparaafome.com.br/wp-content/uploads/ 2022/06/Relatorio- II-VIGISAN-2022.pdf 2 Insegurança Alimentar utilizada por essa pesquisa é medida por meio da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), que classifica a insegurança alimentar em leve (preocupação ou incerteza quanto acesso aos alimentos no futuro, qualidade inadequada dos alimentos resultante de estratégias que visam não comprometer a quantidade), moderada (redução quantitativa de alimentos entre os adultos e/ou ruptura nos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos dos adultos) ou grave (redução quantitativa de alimentos e/ou ruptura nos padrões de alimentação resultante da falta de alimentos entre crianças; fome - quando alguém fica o dia inteiro sem comer por falta de dinheiro). 3 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. população mais pobres. A terceira seção discute o orçamento das políticas sociais, sob a batuta da austeridade fiscal e os seus efeitos nos gastos sociais. Demonstrando, assim, como o conjunto dessas conformações estatais, fundamentadas sob a égide do capitalismo financeiro mundializado, corrobora para o aumento da pobreza no Brasil. Para a construção da análise são utilizados dados extraídos da Receita Federal do Brasil (RFB) e do sistema SIGA Brasi l 4 . Os dados extraídos do sistema SIGA Brasil demonstram a evolução dos gastos sociais, por função orçamentári a 5 , no período de 2016 a 2019, tendo em vista, ser o marco temporal de início de maior acirramento fiscal, demarcado, no final do ano de 2016 pela Emenda Constitucional 95 que institui um “Novo Regime Fiscal”. Para esse fim, os valores são deflacionados pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de dezembro de 2019, refletindo assim, de forma apropriada a inflação do período em estudo, eliminando os efeitos da variação de preços e da desvalorização da moeda. II. A s C rises do C apital, as C onformações do E stado e D as P olíticas S ociais e o P apel E strutural do F undo P úblico no C apitalismo F inanceiro Ainda que a pobreza seja uma problemática multidimensional, principiamos da premissa que para compreendê-la é preciso partir do seu fundamento socioeconômico, inerente à contradição expressa no modo de produção capitalista de apropriação privada e exploração da força de trabalho, contradições essas que por seu turno, geram as crises do sistema capitalista. As crises são consequentemente, expressões da tendência de crescimento permanente da produção sem consideração do limite do mercado, e como bem apresenta Mészàros (2011), sem consideração do limite da natureza e, assim, das formas de sobrevivência da vida. De forma que, a dinâmica da taxa de lucro, torna- se o único fator capaz de exercer limite ao crescimento do capitalismo. Por conseguinte, a crise estrutural do capital atinge não apenas a esfera socioeconômica, mas todas as dimensões da vida em sociedade. Como apontado por Mészàros (2002) trata-se de uma crise sem precedentes, cujos desdobramentos atingem 4 O SIGA Brasil é um sistema de informações sobre orçamento federal, mantido pela Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle e pelo Prodasen, que permite acesso amplo e facilitado aos dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI) e a outras bases de dados sobre planos e orçamentos públicos. Disponível e m https://www12.senado.leg.br/orcamento/sigabrasil 5 Função orçamentária é uma forma institucional de agregação das despesas no orçamento das políticas públicas no Brasil. © 2023 Global Journals Volume XXIII Issue II Version I 2 Global Journal of Human Social Science - Year 2023 ( )E Unraveling Poverty: Reflections from the Financial Management of the Public Fund in Brazil
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